Política
Editorial
A presidenta está enganada se, ao agir como fariam os derrotados, garante tranquilidade ao seu segundo governo
Evaristo SA/AFP
Volto de viagem, duas semanas de olvido, e sou recebido pelas seguintes informações. Não vou hierarquizá-las ao sabor da sua importância, todas, aliás, me parecem importantes. Se não, vejamos.
O mais inútil dos ministros do primeiro mandato de Dilma Rousseff, José Eduardo Cardozo, insuperável em pronunciar asneiras em momentos de tensão pinçados a dedo, foi confirmado na Justiça.
Aldo Rebelo deixa a pasta do Esporte para dedicar-se à Ciência e Tecnologia, a mostrar sua versatilidade. Vivesse ele na França do século XVIII quem sabe figurasse entre os enciclopedistas e passasse à história como indômito iluminista.
O novo titular do Esporte admite desconhecer a matéria entregue aos seus cuidados, mas se habilita a cumprir a tarefa por conhecer a alma humana. Em 2007 foi preso ao carregar uma caixa repleta de papel-moeda, verdadeiro tesouro dos piratas, e prontamente expulso do DEM, onde militava. Evangelizador antes de evangélico, o ministro infunde segurança na perspectiva das Olimpíadas de 2016, evento de hábito favorável a quem aprecia papel-moeda.
Ao assumir a pasta da Defesa, Jaques Wagner comunica à Nação que não carrega uma lanterna para vasculhar o passado, pelo contrário, encara apenas e tão somente as brumas do futuro. Nítida promessa da continuidade da dita lei da anistia, da impunidade dos torturadores e seus mandantes e da prescrição dos crimes contra a humanidade. Notícia preciosa no país que, pretensamente democrático, inova Montesquieu ao alinhar aos Três Poderes clássicos, o militar, provavelmente por dispor de tanques e canhões, argumento decisivo de uma pressão insopitável na terra da casa-grande e da senzala.
A ministra da Agricultura, Kátia Abreu, exibe toda a sua competência para o posto ao decretar que no Brasil o latifúndio não existe. Pouco importa se a dama em questão não somente ignora que no País 50% das terras agriculturáveis ficam na mão de 1% da população, mas também o tamanho das suas propriedades.
Surgem sinais de que um dos trunfos brasileiros em meio à crise global, o baixo índice de desemprego, começa a ensaiar uma tendência de alta. Com Joaquim Levy na Economia, cabe o temor de que o esboço se torne obra feita e acabada, mais uma conspícua oferenda ao deus mercado.
O ministro das Comunicações aventa novamente a hipótese da regulamentação da mídia, e logo espoucam as reações indignadas dos paladinos da liberdade de imprensa, entendida como aquela atribuída por direito divino aos porta-vozes da casa-grande, e, portanto, credenciados a omitir, inventar e mentir a seu talante. O deputado Eduardo Cunha, pretendente ao cargo de presidente da Câmara, apressa-se a anunciar que, com ele eleito, os propósitos do ministro Berzoini no pasarán.
Isso tudo não me proporcionou uma acolhida alvissareira. As intenções governistas me soam claras: garantir um transcurso mais ou menos tranquilo ao segundo mandato de Dilma. Como se fazer mais ou menos o que a oposição faria, com o useiro apoio da mídia nativa, tivesse o condão de colocar a presidenta a salvo, ao menos em boa parte, da virulência dos ataques daquelas.
A presidenta engana-se. E a quem ela ouve sugiro, por exemplo, a leitura do editorial do Estadão de quinta 8. O que está em jogo é uma questão visceral, pela qual Dilma, faça o que bem entender, representa a malta, assim como seu titubeante partido e quem o fundou, o inextinguível Lula. Não consigo imaginar o que ele pensa neste exato instante. Lá pelas tantas, fui levado a supor, no momento mais agudo do recente embate eleitoral, que criador e criatura haviam se reaproximado. Agora não sei. Única certeza: Dilma precisa de melhores conselheiros.
Editorial
A presidenta está enganada se, ao agir como fariam os derrotados, garante tranquilidade ao seu segundo governo
Evaristo SA/AFP
Volto de viagem, duas semanas de olvido, e sou recebido pelas seguintes informações. Não vou hierarquizá-las ao sabor da sua importância, todas, aliás, me parecem importantes. Se não, vejamos.
O mais inútil dos ministros do primeiro mandato de Dilma Rousseff, José Eduardo Cardozo, insuperável em pronunciar asneiras em momentos de tensão pinçados a dedo, foi confirmado na Justiça.
Aldo Rebelo deixa a pasta do Esporte para dedicar-se à Ciência e Tecnologia, a mostrar sua versatilidade. Vivesse ele na França do século XVIII quem sabe figurasse entre os enciclopedistas e passasse à história como indômito iluminista.
O novo titular do Esporte admite desconhecer a matéria entregue aos seus cuidados, mas se habilita a cumprir a tarefa por conhecer a alma humana. Em 2007 foi preso ao carregar uma caixa repleta de papel-moeda, verdadeiro tesouro dos piratas, e prontamente expulso do DEM, onde militava. Evangelizador antes de evangélico, o ministro infunde segurança na perspectiva das Olimpíadas de 2016, evento de hábito favorável a quem aprecia papel-moeda.
Ao assumir a pasta da Defesa, Jaques Wagner comunica à Nação que não carrega uma lanterna para vasculhar o passado, pelo contrário, encara apenas e tão somente as brumas do futuro. Nítida promessa da continuidade da dita lei da anistia, da impunidade dos torturadores e seus mandantes e da prescrição dos crimes contra a humanidade. Notícia preciosa no país que, pretensamente democrático, inova Montesquieu ao alinhar aos Três Poderes clássicos, o militar, provavelmente por dispor de tanques e canhões, argumento decisivo de uma pressão insopitável na terra da casa-grande e da senzala.
A ministra da Agricultura, Kátia Abreu, exibe toda a sua competência para o posto ao decretar que no Brasil o latifúndio não existe. Pouco importa se a dama em questão não somente ignora que no País 50% das terras agriculturáveis ficam na mão de 1% da população, mas também o tamanho das suas propriedades.
Surgem sinais de que um dos trunfos brasileiros em meio à crise global, o baixo índice de desemprego, começa a ensaiar uma tendência de alta. Com Joaquim Levy na Economia, cabe o temor de que o esboço se torne obra feita e acabada, mais uma conspícua oferenda ao deus mercado.
O ministro das Comunicações aventa novamente a hipótese da regulamentação da mídia, e logo espoucam as reações indignadas dos paladinos da liberdade de imprensa, entendida como aquela atribuída por direito divino aos porta-vozes da casa-grande, e, portanto, credenciados a omitir, inventar e mentir a seu talante. O deputado Eduardo Cunha, pretendente ao cargo de presidente da Câmara, apressa-se a anunciar que, com ele eleito, os propósitos do ministro Berzoini no pasarán.
Isso tudo não me proporcionou uma acolhida alvissareira. As intenções governistas me soam claras: garantir um transcurso mais ou menos tranquilo ao segundo mandato de Dilma. Como se fazer mais ou menos o que a oposição faria, com o useiro apoio da mídia nativa, tivesse o condão de colocar a presidenta a salvo, ao menos em boa parte, da virulência dos ataques daquelas.
A presidenta engana-se. E a quem ela ouve sugiro, por exemplo, a leitura do editorial do Estadão de quinta 8. O que está em jogo é uma questão visceral, pela qual Dilma, faça o que bem entender, representa a malta, assim como seu titubeante partido e quem o fundou, o inextinguível Lula. Não consigo imaginar o que ele pensa neste exato instante. Lá pelas tantas, fui levado a supor, no momento mais agudo do recente embate eleitoral, que criador e criatura haviam se reaproximado. Agora não sei. Única certeza: Dilma precisa de melhores conselheiros.